Ambiente de trabalho
Empresas, trabalhadores e um problema de expectativas
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Caro leitor,
Contratar e reter talento é um dos maiores desafios com que as empresas (em Portugal e noutros países do mundo) se confrontam neste momento. Há várias razões que explicam esta dificuldade e a forma como a geração nascida entre 1981 e 1996 encara o trabalho é uma delas. É como se, nos últimos anos, se tivesse aberto uma fenda entre as expectativas destes trabalhadores - que constituem uma parte significativa da força laboral - e as das empresas, que impede que elas se encontrem.
Vários estudos e inquéritos têm dado conta da mudança na forma com as novas gerações olham para o trabalho, que deixou de ser o centro das suas vidas, dando prioridade à flexibilidade, a empregos alinhados com os seus valores, à aprendizagem e à mobilidade.
Um relatório recentemente divulgado pela Gallup vem confirmar mais uma vez que os millennials têm maior probabilidade de procurar novos empregos e estão menos envolvidos no trabalho do que outras gerações. O inquérito conclui que 21% destes trabalhadores trocaram de emprego no último ano, três vezes mais do que outras gerações; 50% contam estar na mesma empresa daqui a um ano, quando a média é de 60%; e 36% asseguram que irão procurar um novo emprego.
Mas porque é que esta geração tem tanta probabilidade/desejo de mudar? Uma das razões pode ser o seu reduzido envolvimento com o seu trabalho e com a empresa. A Gallup alerta que apenas 29% dos millenials se sentem ligados à empresa, enquanto a maioria (55%) não tem qualquer envolvimento.
Isabel Roseiro, directora de marketing e comunicação da Randstad, nota que algumas das características atribuídas aos millenials encontram-se também noutras gerações, embora com nuances e intensidades diferentes. "A priorização da flexibilidade, de um ambiente de trabalho positivo e de oportunidades de desenvolvimento é uma tendência crescente em todos os grupos etários", refere.
A geração Z, por exemplo, "tem vindo a demonstrar preferências semelhantes, na procura de modelos de trabalho híbridos e numa maior autonomia no espaço de trabalho", acrescenta David Ferreira, responsável pela Robert Walters em Portugal.
Seja entre os millenials ou noutras gerações, a verdade é que se tem vindo a assistir a uma mudança de valores, com impacto directo nas estratégias de atracção e retenção de talentos, obrigando as empresas a adaptar-se.
Portugal não tem sido imune a esta procura de flexibilidade e de modelos de trabalho híbridos, nem à competição entre as empresas pelos melhores trabalhadores. Os consultores com quem o PÚBLICO falou consideram que este fenómeno tem sido particularmente visível em áreas "altamente competitivas" como a tecnologia, a consultoria, o marketing, a comunicação e as vendas, sobretudo no período pós-pandemia.
As empresas, destaca David Ferreira, não podem ficar indiferentes a estas tendências e a falta de adaptação pode ter consequências indesejadas como elevadas taxas de rotatividade e dificuldades em atrair candidatos qualificados. "O nível de exigência é cada vez maior e são os candidatos a ter a palavra final, não as organizações", refere o responsável em Portugal pela consultora de recursos humanos Robert Walters.
"As empresas que reconhecem e apoiam a necessidade de dar uma maior importância ao equilíbrio entre vida profissional e pessoal estão em melhor posição para atrair e reter talentos. Além disso, a capacidade de oferecer opções de teletrabalho pode ser crucial num mercado cada vez mais competitivo", nota por seu lado Isabel Roseiro, num momento em que um pouco por todo o mundo as empresas procuram um regresso ao trabalho presencial.
David Ferreira corrobora: o teletrabalho e os regimes híbridos "desempenham um papel fundamental na atracção de trabalhadores das gerações mais jovens" e são muito valorizados, "contribuindo para um maior equilíbrio entre vida pessoal e profissional, aumento da satisfação no trabalho e melhoria da produtividade".
Algumas das estratégias que as empresas podem adoptar passam por:
- Oferecer opções de trabalho remoto, horário flexível e regimes híbridos;
- Promover mais oportunidades de desenvolvimento profissional, assim como investir em programas de formação, mentoria e oportunidades de progressão na carreira;
- Investir em temas de responsabilidade social corporativa, promovendo o compromisso com causas sociais e ambientais alinhados com os valores dos trabalhadores mais jovens;
- Criar um ambiente de trabalho positivo, inclusivo e que valorize a diversidade;
- Adoptar tecnologias e ferramentas que possibilitem o trabalho remoto e colaborativo.
Mas a verdade é que a resposta para este dilema exige esforço de ambas as partes. Se, por um lado, as empresas precisam de estar atentas e de se adaptar às novas gerações; os trabalhadores também terão de ajustar as suas expectativas e reconhecer a importância da resiliência e do compromisso no longo prazo.
Sabia que…
Durante o período experimental qualquer das partes pode denunciar o contrato sem justa causa, sem aviso prévio (excepto quando durou mais de 60 ou de 120 dias) e sem pagamento de indemnização?
Previsto nos artigos 111.º a 114.º do Código do Trabalho, muitos autores e juristas defendem que o período experimental está em permanente tensão com a Constituição da República. É que, ao mesmo tempo que a constituição garante a segurança no emprego e proíbe o despedimento sem justa causa, no período experimental o contrato pode ser denunciado por qualquer das partes sem justificação.
Ainda assim, a lei não exclui que possa haver casos em que a denúncia do contrato no período experimental é abusiva, como o caso de uma trabalhadora despedida durante o tempo de prova porque o empregador descobriu que está grávida. Neste caso, cabe ao tribunal declarar o carácter abusivo da denúncia e respectivos efeitos relacionados com o pagamento de uma indemnização e reconhecimento de direitos.
Trabalho extra
Cadavez mais jovens rejeitam o trabalho, a educação e a formação
O Financial Times dá conta de um aumento do número de jovens britânicos insatisfeitos com o mercado de trabalho e que não estão na escola, não têm emprego ou não fazem formação (os chamados NEET ou nem-nem). O fenómeno está a aumentar em vários países devido a dificuldades económicas, à saúde mental ou ao descontentamento com as condições laborais, com consequências preocupantes.
O artigo dá conta de fóruns online onde estes jovens partilham experiências. Há uns que optam por se afastar do mercado de trabalho tradicional para explorar interesses pessoais, outros que largaram tudo porque achavam que as suas condições de trabalho eram más e não ganhavam o suficiente, mas que agora dependem de amigos ou familiares para subsistir enquanto tentam encontrar alternativas.
Trabalhadores virtuais podem integrar a força de trabalho já este ano
O presidente executivo da OpenAI, Sam Altman, antecipa que os trabalhadores virtuais podem começar a integrar a força de trabalho já em 2025.
A Microsoft, principal parceira da OpenAI, já anunciou a introdução de ferramentas de inteligência artificial capazes de realizar tarefas de forma autónoma. A consultora McKinsey, por exemplo, é uma das primeiras a adoptar estas soluções, tendo anunciado a criação de uma ferramenta para processar pedidos de novos clientes, realizando tarefas como o agendamento de reuniões. Todo um mundo novo que pode acompanhar neste artigo do The Guardian.
Novas licenças parentais com pouca adesão
As novas licenças parentais introduzidas com a Agenda do Trabalho Digno tiveram até agora uma utilização reduzida, com os pais a preferirem as modalidades mais antigas.
Os dados oficiais mostram que apenas 597 pessoas pediram subsídio parcial, o que representa 0,23% das 264.103 licenças parentais pedidas entre 1 de Maio de 2023 e 13 de Dezembro de 2024. Já a licença de 180 dias pagos a 90% se o pai ficar 60 dias, no mínimo, em exclusivo com a criança foi accionada por apenas 5617 pessoas, o que representa 5,1% do total de licenças partilhadas.
Contratos de teletrabalho aumentam 30% num ano
O jornal digital ECO dá conta de um aumento do número de contratos de trabalho que prevêem o exercício de funções à distância não tem parado de subir. Apenas num ano, aumentou 30%, superando a fasquia dos três mil contratos.
Os dados do Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) do Ministério do Trabalho mostram que, dos quase 3,3 milhões de trabalhadores por conta de outrem registados em 2023, cerca de 2,3 milhões tinham contratos sem termo e, destes, 3006 previam a prestação subordinada de teletrabalho. Em comparação, no ano anterior, contavam-se 2305 contratos deste tipo.